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Museu do Ouro

Série Momentos – Carta de Alforria de Luzia Pinta

publicado: 09/09/2021 16h47, última modificação: 10/09/2021 16h52

Mulher negra nascida em Luanda/Angola, Luzia viveu aproximadamente até os 12 anos de idade em sua terra natal em posse de Manuel Lopes de Barros, seu então senhor. Foi trazida para o Brasil por volta do ano de 1712, passou pela Bahia e, posteriormente, estabeleceu-se na recém-criada Vila de Nossa Senhora da Conceição do Sabará. Em 1718 a escravizada comprou sua própria liberdade de seus então senhores João Pinto Dias e Manoel Pinto Dias. Não se sabe ao certo se o sobrenome “Pinta” foi incorporado por Luzia devido a suas origens ou como uma variação do sobrenome de seus senhores à época do processo de alforria.

Luzia, quando criança e antes de ser trazida para o Brasil, já havia sido convertida ao catolicismo. Entretanto, aplicando os conhecimentos obtidos quando ainda vivia em Luanda, era conhecida nos arredores de Sabará como exímia curandeira e praticante do calundu. O calundu é parte integrante de um ritual de origem ambundas e bacongas da África Centro-Ocidental em que é estabelecida uma ligação espiritual com entidades ancestrais e poderes sobrenaturais são adquiridos. Por meio destes, era possível a realização de cerimônias de adivinhação e cura em pessoas enfermas. Após denúncias, as práticas da liberta não foram bem recebidas pela Igreja Católica e ela acabou sendo enviada ao Tribunal do Santo Ofício em Lisboa que, a partir do ano de 1741, prosseguiu com a acusação. À época, Luzia contava cerca de 50 anos de idade, o que indica que durante grande parte de sua vida difundiu suas práticas nas Minas Gerais setecentistas. Um interrogatório foi realizado e mesmo tendo negado a associação de suas práticas ao mal e reiterado sua fé católica, acabou condenada ao cárcere nos porões da Inquisição. Não se sabe ao certo o paradeiro da Curandeira após a sentença, mas é possível que ela tenha morrido na prisão.

A carta de alforria de Luzia Pinta, importante persona para se compreender as dinâmicas sociais da época, está disponível para consulta na Casa Borba Gato como parte integrante do acervo documental histórico, tendo sido localizada pelo historiador Douglas Lima, autor do livro Libertos, patronos e tabeliães (Caravana, 2020).

Referências
● MARCUSSI, Alexandre Almeida. Iniciações rituais nas Minas Gerais do século XVIII: os calundus de Luzia Pinta. In: Anais do II Encontro Nacional do GT História das Religiões e das Religiosidades. Maringá: Revista Brasileira de História das Religiões – ANPUH. v. 1, n.3, 2009.


● LIMA, Douglas; PAIVA, Eduardo França. A polissemia das alforrias: significados e dinâmicas das libertações de escravos nas Minas Gerais setecentistas. 2014. 156 f., enc Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas. Disponível em: http://hdl.handle.net/1843/BUBD-9Y3JYL


● MOTT, Luiz. O calundu-angola de Luzia Pinta: Sabará, 1739. Revista do IAC. Ouro Preto, v. 2, n. 1 e 2, 1994.

● Biografias de mulheres africanas: https://www.ufrgs.br/africanas/luzia-pinta-seculo-xviii/

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